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segunda-feira, 12 de outubro de 2009

A individuação na natureza selvagem


Oi! Tive que fazer a analise desse filme para uma disciplina da faculdade, mas eu gostei muito do filme, é tão intenso. Lá vai a primeira analise.

Filme: Na natureza Selvagem

Sinopse: Início da década de 90. Christopher McCandless (Emile Hirsch) é um jovem recém-formado, que decide viajar sem rumo pelos Estados Unidos em busca da liberdade. Durante sua jornada pela Dakota do Sul, Arizona e Califórnia ele conhece pessoas que mudam sua vida, assim como sua presença também modifica as delas. Até que, após 2 anos na estrada, Christopher decide fazer a maior das viagens e partir rumo ao Alasca. (extraido do site adorocinema)

Individuação na natureza selvagem

A individuação está associada a uma crise, podemos dizer que já no inicio do filme Christopher aparece como um rapaz que está passando por uma crise, ou seja, ele é um rapaz que até o momento inicial do filme é um “bom homem”, é um bom estudante, bom filho. Só que no decorrer do filme percebemos que a sua relação com a família o incomodava, principalmente (pelo que aparece no filme) as constantes brigas dos pais.
Nesse contexto o protagonista parece “fugir” de tudo, talvez isso seja uma forma que ele encontrou de tentar se colocar no mundo a partir do que lhe particulariza, tentando se desvincular dessa figura de “bom homem” que poderíamos dizer que era uma persona que ele utilizava para poder se mostrar no exterior.
A partir do que afirma Jung (2001) sobre a individuação em que ela “significa tornar-se um ser único, na medida em que por “individualidade” entendermos nossa singularidade mais intima, última e incomparável, significando também que nos tornamos o nosso próprio si-mesmo” (p. 266). A partir disso, podemos pensar que Christopher se confrontou com o maior entrave para a individuação que é a persona, já que esta ajuda na formação do ego, e é um revestimento do ego, dando identidade para esse, além também de falsear a personalidade encobrindo traços mais pessoais, ou seja, o protagonista estava até então identificado com essa máscara social, que não deixava nada sua sombra aparecer. Podemos pensar na sombra a partir dos símbolos oníricos que nos remetem ao conceito como medo, inveja, raiva, ciúmes, vergonha e alguns conteúdos que nos levam à ambientes sombrios, porém é necessário que se tenha esse embate de complexos contraditórios.
Levando em consideração os conceitos acima, podemos supor que o Christopher a partir do momento que decide sair de casa e largar tudo, passa a iniciar o seu processo de individuação, já que esta é a diferenciação da personalidade, a diferenciação da persona em relação à sombra. Pois de acordo com Jung (2001) “a meta da individuação não é outra senão a de despojar o si-mesmo dos invólucros falsos da persona, assim como do poder sugestivo das imagens primordiais (p. 269).
Num primeiro momento Christopher se afasta do mundo, em um movimento narcísico, porém necessário nesse processo, porque até então ele estava totalmente massificado, não conseguindo se colocar como sujeito no mundo, então ele decide se afastar do mundo do qual ele vivia, já que quanto mais se é dependente do mundo externo mais a individuação é prejudicada. Portanto o protagonista doa o seu dinheiro, abandona o seu carro, e passa a ser um “mochileiro”.
Quando ele faz esse esforço que é algo seu, individual, que ninguém mais poderia fazer por ele, no entanto isso ocorreu a partir de uma relação com uma crise com o outro. Porém a individuação é um esforço antinatural, em que o protagonista teve que fazer um grande esforço, para tentar se diferenciar, já que não parecia ser muito fácil, pois a todo momento ele se deparava com pessoas que tentavam colocar ele em determinado lugar que não era o que ele estava buscando.
Para que ocorra essa diferenciação é necessário partir da heterogeneidade que já traz uma idéia de contraposição. O ego precisa o tempo todo estar se diferenciando desses heterônimos, por isso é algo consciente que se contrapõe com o inconsciente, daí que vem a idéia de conflito e crise, porque é preciso extrair aquilo que é mais particular e individual, é preciso tirar o ego dessas misturas. No caso do filme, Christopher teve que se retirar dessa mistura na qual ele se encontrava em relação com a família, podendo tentar fazer uma diferenciação EU-TU.
No decorrer do filme o protagonista encontra com diferentes personagens que na maioria das vezes tentam o colocar em um certo “lugar”, a partir do desejo deles, e isso é exatamente do que o Christopher está tentando se distanciar, desse desejo do outro que é apontando para ele, no entanto, Christopher consegue não se identificar com esse local, mostrando que ele está conseguindo fazer essa diferenciação do que é dele e do que é do outro. Isso tem ligação direta com a individuação, já que esta se liga a autonomia, colocando o individuo no mundo de forma mais particular a partir da sua subjetividade.
Em outro momento do filme, Christopher finalmente chega ao Alasca, local esse que era o planejado desde o inicio da sua viagem, esse seria um momento em que ele estaria sozinho, sem contato com o mundo. Talvez nesse período específico da sua trajetória tenha sido um momento em que ele finalmente pode ter um contato com a sombra, pois no filme são apresentadas diversas cenas em que ele visualiza a sua infância e da relação que ele mantinha com seus pais, e isso aparentava surgir um grande desconforto nele, porém esse encontro com a sombra é muito necessário nesse processo de individuação como afirma Hart (2002):
(...) à medida que o trabalho prossegue, elementos da sombra reprimidos ou renegados tendem a vir á tona cada vez mais – como que encorajados pela atitude consciente crescente de aceitação e honestidade. E, além disso, há o fato fundamental de que a psique busca integridade: o insconsciente está continuamente trabalhando para encontrar admissão e assimilação na vida consciente. (p.104)

Também podemos pensar que esse momento em que ele se encontra sozinho, sem a presença de ninguém a não ser os seus próprios complexos, nesse contexto ele estaria em um momento quase que “divino” já que a sua vontade tem que se submeter ao si-mesmo, como afirma Jung (2002):
Naturalmente, individuação é em última análise um processo religioso que exige uma atitude religiosa correspondente – a vontade do eu de submeter-se à vontade de Deus. Para não provocar mal-entendidos digo si-mesmo em vez de Deus. Empiricamente também é mais exato. A psicologia analítica ajuda-nos a conhecer as potencialidades religiosas (p. 432).

No final do filme o protagonista decide voltar para a família, ou seja, voltar para o mundo, e talvez assim continuar o seu processo de individuação, já que esse processo não exclui o mundo e sim se junta a este, dessa maneira Christopher pode realizar um grande passo, que partiu de um momento de diferenciação e narcisismo. Esse último processo foi necessário já que ele se voltou para si mesmo, tendo esse contato com esses complexos contraditórios, como sombra e persona.
No entanto, no final do filme não se pode saber se realmente esse processo se tornaria genuíno, pois ele não conseguiu voltar para poder sustentar essa tensão com esse outro. Além de que para que a individuação torne-se genuína, o individuo tem que individuar na relação com o mundo (de forma menos massificada), e esse modo de individuar nunca acaba. E somente esse processo de se voltar para si mesmo não é a individuação como afirma Jung (2003) “Também é óbvio que toda introspecção naquilo que chamo de sombra é um passo no caminho da individuação, sem que se deva chamar isso de processo de individuação” (p. 179).
Portanto para que esse processo pudesse continuar, já que ele é continuo, deveria haver finalmente essa derrota para o ego do narcisismo (do pronto, estereotipado) para suportar os conflitos, tendo assim uma abertura para o outro (no mundo). No entanto este último não pode acontecer na vida do Christopher, mas em contrapartida ele teve em contato com esse processo sofrido e estressante que é o processo de individuação, que resulta em um novo nascimento.

Referencias bibliográficas

Hart, David L. A escola Junguiana clássica. In: Manual de Cambridge para estudos Junguianos. Young-Eisendrath, Polly; Dawson, Terence. (org). Porto Alegre: Artmed Editora, 2002.

JUNG, C. G. Cartas II. Petrópolis: Vozes, 2002.

JUNG, C. G. Cartas III. Petrópolis: Vozes, 2003

Ass: Paulatictic

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